segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Idealismo

Esta talvez seja a conclusão menos nova a que eu já tenha chegado, mas de qualquer modo compartilho-a com os poucos que, por algum motivo, lêem as ideias que me saem da cabeça. Direto ao ponto, Ano Novo parece, para mim, um momento triste, ao contrário do clima de festa que se cria ao redor da passagem do tempo. Pois se há tantas promessas e tantas simpatias, é porque há um sinal de que as coisas não vão exatamente do modo como gostaríamos. Obviamente, isso nunca foi nem nunca será uma questão que depende só de nós. De qualquer modo me parece que é um momento em que, num ato mecânico, pois estamos tão acostumados a simplesmente comemorar ou celebrar a chegada de um ano novo, viramos os rostos para a frente e propomos metas para esta nova data que chega. Mas me parece também, que no fundo, choramos pelas metas que soubemos não sermos capazes de cumprir; as do ano que passou. E me pergunto se não passamos tempo demais desejando a vida de uma forma e tempo de menos lutando para que ela seja da forma como queremos.
Mas, ainda que nem tudo dependa de nós, desejar um pouco mais, ou muito mais do que o possível talvez simplesmente demende coragem demais.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Vital

Medo da espera. É assim que se cria este vício letal, essa arritmia que são as paixões. Esperar o quejá se sabe; sucesso ou insucesso, e viver com a angústia da epera pelo momento derradeiro, bem como com a incerteza do que se sente. No fim, talvez tenhamos mesmo a obrigação de sermos racionais. Amor demais também faz mal ao coração e os instintos e as pulsões, se deixamos que nos levem neste mundo que vivemos, serão instintos e pulsões de morte, e só. Imagino se a decisão racional pelos impulsos não seria já uma vontade de morte, de extinguir-se pela desmesura, pela desproporçao, om o intuito de, no fim, ter sido fiel a tudo que se sentiu; mártir.
Os coitados de hoje são, no fundo, os cínicos que crêem só em seus corpos e confortos. São eles mesmos, em suas mentes, valores de verdade, porque são causas sem justificativa, o que, para eles, é mais do que legítimo. Essa impossibilidade de sairem de si e perceber as coisas não em sua consciência ou em seu corpo, mas nas coisas mesmas, é o mal que se vive. Ou a desmesura ou a cesura. De uma forma ou de outra, o mundo opta pela desrazão, pela fé cega no bem, seja ele próprio ou comum, no prazer e na boa vida. Dizemos amar a vida, mas vivemos tão distantes dela e criamos nossas religiões, nossos cultos e toda essa encruzilhada cuja meta parece ser pura e simplesmente a redenção...

sábado, 11 de dezembro de 2010

Licença Poética

“[...] eu [...], de filosofias não entendo nada” – 17/05/1993


SARAMAGO, José. Cadernos de Lanzarote I. São Paulo:Companhia das Letras, 1998.

Alfabeto

Como não me encantar com esta língua que me une ao moçambicano e ao angolano, ao português e ao guineense, a caboverdiano e ao de São Tomé; quiçá a Macau e Goa o que acho mais difícil. Mas de qualquer modo, como não amar a língua de Camões, Quental, Pessoa, Guimarães Rosa, Drummond, Bandeira, Craveirinha? Essa língua que é um mar vasto e repleto de praias e portos nos quais se ancorar. Esta língua que a-e-i-o-ua; essa língua oceânica que, tão vasta quanto os mares é a única que sabe o que é a saudade, esse amor do tato ausente, esse sentir-se em casa longe do lar...
Essa língua não é uma língua portuguesa, mas tantas e diversas; línguas e português.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Saramaguiana-Benjaminiana?

“O catálogo de horrores deste campo de concentração chamado Mundo é inesgotável”  - Cadernos de Lanzarote

Estética saramaguiana

“A arte não avança, move-se”

Matéria, memória, relato - Bergson por um caso específico

A filosofia de Henri Bergson é dificilmente classificável entre as correntes predominantes da filosofia na medida em que prega uma filosofia dualista, na tentativa de superar a divisão entre idealismo e realismo, empírico e a priori. Para ele, o mundo se divide em duas partes desiguais: de um lado a vida e de outro a matéria. O resultado entre o choque constante dessas duas partes é o universo.

Neste jogo de forças o intelecto é, de acordo com Bergson, o infortúnio do homem, pois é uma incapacidade natural para compreendera vida; “a geometria e a lógica, que são seus produtos típicos, são estritamente aplicáveis a corpos sólidos, mas, quanto ao resto, o raciocínio tem de ser refreado pelo senso comum”. Não obstante, matéria e intelecto são constituídos do mesmo estofo, o que significa que não há coisas separadas, mas um fluxo interminável de vir-a-ser. O grande problema a ser resolvido é que o intelecto, que separa as coisas, não é ativo, como a vida, mas puramente contemplativo. O intelecto, assim, relaciona-se com o espaço, tende para a materialidade; a intuição, ao contrário, relaciona-se com o tempo; tempo este que não deve ser entendido matematicamente, mas pelo conceito da durée, que forma o passado e o presente num todo orgânico.

É na memória que a durée se mostra, pois na memória o passado sobrevive no presente. Matéria e memória mostram, assim, a relação entre mente e matéria. Matéria e memória mostram, assim, a relação entre mente e matéria, superando a cisão idealismo/realismo na medida em que afirma ambas como reais na intersecção da mente e da matéria, que é a memória. No extremo oposto, Bergson coloca a percepção pura, que é o grau mais inferior da mente, isto é, mente sem memória, e é constituída pela ação do aparecer; sua totalidade reside em sua atividade. Assim o cérebro se torna importante para a percepção, na medida em que não é um instrumento de ação, sendo que sua função é limitar nossa vida mental ao que é praticamente útil.

Esse é, enfim, o intelecto, aquela faculdade a qual Descartes enfatizou como suprema; faculdade que divide e ordena o mundo em coisas separadas. A intuição, por outro lado, apreende uma multiplicidade de processos que se interpenetram, algo raro ao intelecto. Na medida em que Bergson destaca a ambigüidade entre as duas grandes correntes filosóficas, sua filosofia emerge como essencialmente crítica, esforçando-se para resolver a problemática tempo/espaço, matéria/memória de modo que implica, logicamente, uma releitura das doutrinas realista e idealista.

O realismo fala de coisas, o idealismo de representações. São dois sistemas de notações diferentes. O idealismo deposita toda validade no intelecto. Nele, a modificação cerebral é um efeito da ação dos objetos exteriores. Já o realismo retira destitui toda esta validade e transfere-a para a materialidade. No que diz respeito ao psicofisiologismo, por meio do qual as teorias do conhecimento idealista e realista se dão, só parece ser possível empregar, ao mesmo tempo, os dois sistemas.



O relato de Oliver Sacks que dá nome a seu livro Um Antropólogo em Marte, ajuda-nos a compreender um pouco a relação entre mente e matéria que Bergson procura superar. Este relato conta a história do contato de Sacks com uma pesquisadora estadunidense autista. Sacks a conhece por intermédio de uma médica amiga sua que havia trabalhado com Temple, a cientista autista e passa um fim-de-semana com ela. O mais interessante de seu relato é a descrição de como a vida de Temple é vivida no dia-a-dia.

O que se vê na forma como Temple lida com sua memória, pois a memória tornou-se, ao longo de sua vida, a principal arma contra sua incapacidade de interpretar convenções sociais bem como introjetar estímulos e transformá-lo sem sentimentos. O que se percebe nela é que está recepção de estímulos é feita como recepção daquilo que Bergson chama de dados imediatos, ou seja, como pura qualidade e não como quantidade. Há algo que é puramente característico da natureza humana e que se exprime radicalmente na mente de Temple: a dificuldade de apreender a consciência interna imediata e como pura qualidade mutante. Para isso, é necessária a espacialização do fluxo qualitativo, que é a durée. O intelecto então fragmenta, espacializa a realidade. Em contrapartida, perde-se a natureza do objeto concreto, que só vem pela intuição. A inteligência acaba por permanecer assim, no nível das relações.

Tudo ao que Temple tem acesso são somente relações entre as coisas vividas. Quando Temple vivencia alguma situação em que alguém se sente desconfortável, ela precisa acessar todo um registro de relações similares em sua mente que remontam até o presente para que possa compreender o que se está passando. Ela teve de aprender a intuir, no sentido de apreender a relacionar situações interpenetrantes. Sua mente é a prova de que o trabalho intuitivo descrito por Bergson é estranho ao intelecto. O cérebro de Temple também limita sua vida mental ao que é praticamente útil, mas o que é praticamente útil para ela não se relaciona de forma alguma aos estímulos exteriores que seu cérebro recebe.

O cérebro de Temple, além disso, mostra que não há realidade somente nas representações assim como a realidade não é inerente à matéria que serve para nossas representações. Mas que tanto a matéria quanto a representação dela só fazem sentido juntas. Pois o que seu cérebro faz é exatamente, separá-las e todo esforço de Temple se move no sentido de resignificá-las unindo-as. E ela faz isso com muito sucesso. O que lhe falta, no entanto, é a intuição pura para unir, por meio da durée, toda a série de vivências passadas no presente por meio de suas significações. Não há sentido em suas vivências e é por isso que ela é incapaz de sentir, embora compreenda o que sejam e porque se dêem os sentimentos.

È interessante lembrarmos que durante seu relato Sacks aponta o autismo como uma questão que toca nas mais profundas questões de ontologia, uma vez que envolve um desvio radical no desenvolvimento tanto do cérebro quanto da mente. E isso fica muito claro quando ele fala, por exemplo, da idéia de Asperger, um dos descobridores do autismo, de uma “inteligência autista”. De fato, se lermos atentamente a descrição da mente de Temple, veremos que o intelecto autista – intelecto deve ser entendido segundo Bergson – parece ser uma inteligência radicalmente ordenadora. A mente autista evolui progressivamente em matéria de conteúdo e aritmeticamente em matéria de significado. É quase como se a mente autista fosse idealismo puro embora a capacidade de conscientização das limitações seja imensa, como no caso de Temple.

De maneira peculiar, no entanto, vemos em Temple a complexidade do cérebro humano. Em Temple parece faltar a intuição que une as relações num tempo uno interpenetrável. Essa intuição, no entanto aparece presente em Temple em dois momentos: o primeiro quando vemos suas relações com os animais, nas quais ela mesma diz realmente sentir e compreender os sentimentos animais, como algo natural; e a segunda, quando Temple mostra a Sacks sua “máquina de espremer”. Essa máquina, desenvolvida por ela mesma atua por um mecanismo de cilindros que distribuem sobre o corpo de Temple uma certa pressão que a faz recordar dos abraços de uma tia gorda que a visitava quando ela era criança. Quando Temple sente toda a pressão em volta de seu corpo, ela é capaz de alcançar um sentimento pelos outros. Temple parece assumir um recurso trabalhado por Bergson na idéia da durée, mas cujo conceito foi mais largamente desenvolvido por Walter Benjamin: o da mémoire involontaire. No momento em que é “espremida”, toda uma séria de relações se interpenetram desde a juventude até sua vida presente e Temple é enfim, capaz de significar sua vivência.



De qualquer modo, a filosofia de Bergson é muito complicada. Não há como fazer aqui, um tratado sobre as relações entre sua filosofia e as síndromes mentais. No entanto, esperamos ter sido possível uma leitura em que o tema tratado por Bergson na bibliografia utilizada no curso e um dos relatos de Oliver Sacks, também utilizado no curso, se cruzem a partir do momento em que Bergson trata, por exemplo, da relação entre mente e cérebro e Sacks trata da forma como corpo e mente se separam efetivamente, dia-a-dia em pessoas com síndromes psíquicas. Deste modo, esperamos poder ter debatido um pouco as questões que permeiam a filosofia de Bergson para mostrarmos como a filosofia pode ser aplicada e entendida na vida prática e também, esperamos ter debatido um pouco, a partir das experiências relatadas por Sacks, a forma como as questões da ciência estão presentes em nosso dia-a-dia.

Quinquilharias

Há algo misterioso nas fotos antigas, nos cheiros de nossas roupas de bebês guardadas no fundo de algum armário, nos brinquedos que recusamos a doar. Pois todas essas coisas nos remetem a outros tempo: as primeiras a momentos em que quase sempre sorrimos eternamente; as segundas a um tempo que não podemos lembrar; e as terceiras a momentos em que, brincando, resumiamos a cultura e invertiamos a ordem do mundo. Fazíamos dos bonecos o objeto e o meio de nossa dominação; e dominávamos para o deleite, não para o poder.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O colono penal

No sonho, à la Fanz Biberkopf eu havia sido jogado de um carro - se pelos mesmos motivos, não sei dizer - mas ao invés de perder um braço, perdera os movimentos das pernas, tornara-me paraplégico. Além disso, fui condenado a cumprir pena em alguma prisão, cujo pátio era projetado como os pátios escolares do ensno primário; acredito realmente que fosse o pátio do próprio colégio onde eu havia feito o ensino primário.
No canto esquerdo do pátio, uma engrenagem grande, muito larga e comprida, de cerca de 15 metros por 15 metros, como uma quadra de basquete quadrada. Mas ao invés de piso de madeira, lâminas e roscas que iam e vinham. Parece que eram a parte externa superior de uma máquina cuja finalidade e mesmo a aparência todos desconheciam. Mas, por causa da cadeira de rodas, eu era o único que podia me instalar na máquina, o único que podiapassar por cima dela sem se machucar. Eu era o estado de exceção do mecanismo carniceiro que havia matado tantos - seja por descuido seja como consequência de brigas dos detentos. E tanto era que eu passei a usar a máquina para me exercitar, treinar os braços e os reflexos, desviando das lâminas que subiam, mesmo sabendo que não me acertariam, e apostando corrida com aquelas que corriam de um canto a outro do complexo maquinário.
Os poucos conhecidos que fizera, uma mulher quase idosa, uma adolescente - cujos rostos me fogem da memória - e dois homens cujos rostos nunca cheguei a ver, me observavam queando eu me exercitava e me lembro que ríamos prazerosamente quando eu encerrava minahs sessões. Estranhamente, eu pensava só havermos nós presos ali.
No fim do dia, um rabino tentava me doutrinar, falando dos mistérios de Deus e da necessidade de aceitação do que Ele nos reservava. No começo, o rabino possuía fartas barba e cabeleira ruivas, que acabaram dando lugar à calvície, que fez surgirem rugas profundas que quase escondiam seus olhos.
No fim do sonho, enquanto o rabino gritava, a única coisa que eu me lembro era de olhar para uma moça morena sentada ao meu lado, assustada e eu também, assustado, pois ela trazia flores no cabelo, um vestido rendado e eu soube que a máquina a devoraria...

sábado, 13 de novembro de 2010

História material

Assim como as parisienses, para divulgarem mais facilmente sua mda, lançavam mão de um reprodução atraente de suas novas crianções pelas bonecas manequins, que, após terem cumprido sua função de figurinos de moda, eram presenteadas às meninas como brinquedos, hoje também os meninos recebem em cd's e dvd's ou chips de videogames portáteis, as armas de última tecnologia e o sonho de armas futuras.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O suspiro

O que tem cansado é a glamourização da vida, é o retorno daquele caráter afirmativo da nossa cultura, é a transformação da política em estética, em espetáculo, sob a sombra do desenvolvimento, quando a visão diária que se tem é a de um mundareu de gentes cabisbaixas...

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Brasiliana

A primeira coisa que talvez se devesse considerar ao se falar em preconceitos no Brasil é que parece haver algo que precede esses próprios preconceitos. Sejam eles "raciais", econômicos, de gênero e etc. E isto é que o brasileiro tem preconceito contra si mesmo enquanto um povo, ou seja, enquanto brasileiro. Preconceito quando consideram o brasileiro pouco confiável ou preguiçoso. É isso ou o contrário que é exatamente um preconceito às avessas: assumir que tudo que vem de nós é lindo, genuíno, porque "é isso que somos". Por um lado transforma-se a pobreza e ignorância em beleza; por outro, tomam-se todas as más manifestações como se estas fossem os únicos hábitos possíveis de advir de indivíduos que crescem nesta sociedade.
O caráter de um povo existe, não tenho dúvida. Cada povo possui suas particularidades e hábitos de vida próprios, mas o caráter dos povos não estão aliados a um discurso ideologicamente político. Até agora, todas as tentativas de identificar esse nosso caráter parecem ter sido feitas com o pressuposto político de esquerdas ou direitas. No fundo de tudo isso, parece que sabemos muito bem  o que somos. Só nos falta assumir; inclusive para mudarmos a nós mesmos.

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The first thing one should have in mind when talking about the prejudices of brazilian people is that there is something that precedes all kind of prejudices, whether it is racial, economical, of gender and etc. And that is that brazilians seem to have prejudices against themselves as a people. Prejudice when considering themselves as unworthy of trust, as a lazy people. Is either that or its contrary, wich is a prejudice au contraire: assuming that anything that comes from ourselves is beautifull, is genuine, because that "the way we are". It´s either making all the poverty and ingorance the most beautifull thing or generalizing all our bad manifestations as they were the only possible habits one or another could have as individuals.
A caracther os a people exists, I have no doubt about it. Each people has its particularities and own life habits, but they´re not conected to a pressuposition that is ideologically political. So far, all the atempts to identify this caracther of ours seem to have been made with teh pressuposition of left an right wings. At the bottom of all of that, it seems to me that we know well what we are. The only thing that´s left is to assume it; specially so we can change it.

domingo, 17 de outubro de 2010

A nova esquerda

Uma das 10 teses escritas por Korsch em 1950:

2. Today, all attempts to re-establish the Marxist doctrine as a whole in its original function as a theory of the working classes social revolution are reactionary utopias.

(2. Hoje, todas aas tentativas de re-estabelecer a doutrina Marxista como um todo em sua função original de uma teoria da revolução social da classe trabalhadora, são utopias reacionárias)
 
Parece que a esuqerda brasileira se esqueceu disto. Afinal ela anda falando em "inimigos do povo" e preconceito contra as "classes populares".
 
Tirem suas conclusões. Em tempos de eleições, isso pode parecer campanha, mas a verdade é que qualquer que seja o mandante, de mim vocês só ouvirão críticas. Assim sendo, tirem suas próprias conclusões...
 
Quem quiser o texto todo, acesse: 

Ciências Sociais e Cultura Política

O que me cansa nos cientistas sociais, intelectuais de nossa época, junto com economistas e psicólogos, é que eles têm a irritante mania de achar que levam as coisas a sério, tendo sempre que tomar partido, que proferir palavras de ordem. A cegueira a que são levados por não conseguirem se encontrar dentro de seus próprios campos - pois conhecem os problemas do cientificismo, mas estão cientes de sua incapacidade de filosofar - os leva a uma profissão de fé maniqueísta: "quem não está comigo está contra mim". Porque no fundo, baseiam suas pesquisas em suas crenças.
Esse maniqueísmo é comum na cultura política brasileira: a esquerda "militante" - infelizmente a que ficou respnsável por contar a história de quem desapareceu - filha do partidão, com suas concepções "realistas" da velha URSS; e a direita reacionária, religiosa e imbecil. Uma e outra são iguais, salvo nomes e "classe social". Nas ciências sociais, resta saber em quais dos grupos você se encaixa, em quê você acredita... A velha tradição crítica da qual Florestan foi um dos precursores, morreu, englobada pelos discursos políticos. A situação dos pensadores da sociedade, esta situação embutida de religiosidade, é reflexo também daquilo que o ensino no Brasil se tornou, e de até que ponto a política é usada como dispositivo não para o controle, mas antes, para algo que dispense o controle, algo que torne o próprio controle desnecessário, um dispositivo que injeta uma auto-regulação nas pessoas.
A política é séria, claro, mas não dessa forma, não por partidos, não por discursos, não por campanhas. No fim, não deve importar "no que se acredita", mas, enfim, somos nós, cientistas sociais, psicólogos, economistas os grandes intelectuais que fazemos essa discussão, que alimentamos essa cultura política da crença em ideologias. Talvez sejamos nós o grande problema.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Democracia II

Novas do Oriente Médio:
Israel é um Estado judeu E democrático. Quem se quiser cidadão israelense deve jurar fidelidade ao judaísmo da nação, ou "judaísmo de Estado", por que não? Não sei exatamente de que democracia se trata quando um dos pilares fundamentais de um Estado que se diz democrático é o de liberdade religiosa. O que isso significa, de fato é que qualquer um pode habitar a região, mesmo aqueles que estavam lá antes da fundação do Estado de Israel, contanto que admitam uma certa história que os israelitas têm como correta: a de que, sendo o povo escolhido, aquela terra é deles e somente deles, dada diretamente por D'us. Mais uma vez, a transformação da história em tabu leva aos absurdos da atualidade. A transformação da religião em política pelo Estado de Israel faz com que eles regridam séculos rebaixando-se ao mesmo nível daqueles que eles consideram seus grandes perseguidores: a Igreja, o nazi-fascismo. Aliando-se a isso o poderio nuclear, Israel não só faz papel de ridículo, com seus racismos e absurdos, como sofrerá, se não tomar cuidado, a legitimação de suas perseguições.
A outra nova é o pedido de posse dos manuscritos de Kafka que, segundo Max Brod, deveriam ficar para a Biblioteca Nacional de Jerusalém e, segundo o próprio Kafka, deveriam ter sido todos queimados. De um modo ou de outro, graças a Deus os escritos já pertencem à humanidade. A principal desculpa para esse pedido é que, segundo pesquisadores israelitas, Kafka possuiria por trás de seus textos, um tom "altamente sionista". Benjamin já havia discordado de Brod e debatido longamente com seu amigo - este sim, abertamente sionista - contra as interpretações judaicizantes de Kafka, mas no fi, a meu ver se resume a aqueles ressentidos com o passado, vingativos; e aqueles que se preocupam com o fato de que no mundo contemporâneo, "raças", gêneros e etc só são um alívio para, no fundo, não admitirmos a mesmidade do homem atual...
O rogo de Adorno continua atual: "que Auschwitz não se repita". Mas ele se repete, em Darfur, na França anti-cigana e anti-africana, na China, em Israel...

Cálice

Quando não há mais nada a dizer ou perde-se a vontade de falar, devemos nos silenciar ou gritarmos em alto e claro tom que nosso silêncio é só o medo juvenil de quem não sabe de nada. O silêncio talvez seja mesmo o medo de nos fazermos livres, ou um grito de desespero...

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Democracia

O grande problema da democracia em nosso país é, primeiro, que ela semrpe foi uma mentira; segundo, que nele, um paradigma da própria democracia ganhou proporções gigantescas: o fato de que os meios democráticos são autoritários. No Brasil, é-se obrigado a votar e o respeito pela decisão dos votos desaparece quando o convencimento retórico ganha valor de verdade. No fundo, não só não se é livre para não votar e não participar do jogo representativo, como quase não se é livre para decidir em quem votar, encontrando-se num jogo que é, acima de tudo, sofístico.
Mas ainda que os esquerdetes e reacinhas reclamem de votos em Tiriricas e Malucos-Beleza, esse tipo de voto simboliza que o povo, se sempre soube ou não sabia antes, está aprendendo votar, a utilizar, mesmo que por um protesto falho, essa obrigação de cidadania. A percentagem de votos em Marina Silva simboliza isso muito bem: Espera-se algo mais das elites governantes, dos PMDB's, PT's e PSDB's. Cedo ou tarde, essa bomba explode, caso não cortem o longo pavio deste povo que, de democrático, tem muito pouco.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Coragem

Eu me pergunto entre quantas pessoas que rasgam a garganta com palavras de ordem, seja qual ordem for, tem o peito de fazer, ao invés de falar. Eu sei que quem lutou ao invés de protestar contra a ditadura, não está mais aqui pra contar a história, nos deixando sujeitos a fugidos e mentirosos que sujam os nomes dos desaparecidos. Mas esse é só um exemplo. Outro exemplo seria quem, entre tantos que gritam por amor, tem a coragem de se deixar arrebatar.
A vida toda é cheia de exemplos que apontam essas disparidades, esses desencontros. No fundo, é uma questão de coragem. Atitudes assim nos fazem não só, homens ou mulheres, mas autônomos.

Imaginar

É preciso que inventemos para que conheçamos a verdade.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Uma Impressão - Claire de Lune





Todos os dias poderiam ser preenchidos com a sensação que se tem ao ouvir Debussy...
Será que só eu penso assim? Como não querer sentir-se, todos os dias, como que recém-desperto de um sonho do qual ainda lembramos, com os raios quentes do Sol a cortar-nos o rosto, iluminando em sua fugacidade densa a maior parte do quarto - a maior parte, somente, pois estantes, livros e móveis ficam constantemente mal-iluminados, perpassados por luz em angulações estranhas, se assemelhando à nossa mente a partir do momento em que desperta, ainda que, recém-despertos, correntemente não enxergamos as partes mal-iluminadas do quarto - e ao lado o corpo ainda inerte em inconsciência da pessoa que amamos, preenchendo-nos, então, de completude, de uma doce sensação do sublime - e se é sublime só pode ser doce, por que o belo geralmente é amargo - no momento em que, ainda semi-conscientes, sorrimos, simplesmente e verdadeiramente, sorrimos.
E, mesmo com todo o prazer, todo o deleite a que somos levados ao escutar Debussy, é exatamente nesse querer estar constantemente despertando que nos vemos limitados. Embora busquemos sempre esse estado perene de semi-dormência, semi-inconsciência, há algo que nos impele à vigília completa e, ao despertamos - coisa que faremos queiramos nós ou não - nos lembramos que esse algo é a vida...

Chopin Nocturne Op.9 No.2 (Arthur Rubinstein)



E aí vem um bando de moleque como nós e dizemos que somos nós os românticos...

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O que o Tiririca esqueceu...

Que o Brasil é o país do futuro: pode sempre ficar pior. Então, pior do que tá, fica sim! hahahaha
A situação tá mesmo ficando psicodélica...

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Uma do Tom...

Já postei poemas, músicas, todas brasileiras. Agora uma um pouquinho diferente, do grande Tom Waits. Não achei link para vídeo, infelizmente, então segue só a letra da canção, que é um poema por si só, daqueles, bem de fossa, mas lindo.

San Diego Serenade
(The Heart of a Saturday Night - 1974)

I never saw the morning 'til I stayed up all night

I never saw the sunshine 'til you turned out the light

I never saw my hometown until I stayed away too long

I never heard the melody, until I needed a song.

I never saw the white line, 'til I was leaving you behind

I never knew I needed you 'til I was caught up in a bind

I never spoke 'I love you' 'til I cursed you in vain,

I never felt my heartstrings until I nearly went insane.

I never saw the east coast 'til I move to the west

I never saw the moonlight until it shone off your breast

I never saw your heart 'til someone tried to steal, tried to steal it away

I never saw your tears until they rolled down your face.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Kiko, Kiko, rárárá!

Eu comecei a observar o número de pessoas que se comportam como o Kiko. Lembram do Kiko? Do "Chavo del 8", o Chaves? Pois bem.
Eu costumava me irritar, mas eu percebi que isso é só um motivo para rir. Eu não sei quais são os motivos, na verdade. Nem sei se um dia saberei. Talvez seja porque o país não vai tão bem; talvez porque a educação é ruim; talvez porque o pensamento e o conhecimento está em baixa com a extrema especialização das profissões; ou talvez, como saiu hoje na Folha de São Paulo, porque as mulheres andam mais mal-resolvidas, sem conseguir namorados; ou porque os homens desaprenderam a tratar as mulheres. Talvez seja porque os intelectuais são só um espectro que podem aparecer na figura de qualquer um, em mídias digitais, em novelas, em serviços de utilidade pública. Talvez seja porque o sentido real da crítica neste país - aos moldes daquels 25 séculos de filosofia - desapareceu.
O que é certo é que cada vez mais as pessoas se comportam como "o dono da bola". "A bola é minha só brinca quem eu quiser", dizia o Kiko.
A mim, é um pouco indiferente. Kiko era o dono da bola mas no fim, invejava o biboquê do Chaves...

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Antropologia real

"Hoje estamos às voltas com mitos oportunistas. Os que nascem deste tempo são frágeis, ilusórios, e, como a ilusão, desaparecem assim que seu efeito enfraquece. São enganadores e precários, como inúmeros bens que a produção de massa eo frenesi do mercado entregam i liquidam em curtos prazos. Alimentam ao mesmo tempo empanturrado e cansado. As modas os trazem e os levam, são tratados mais como objetos de consumo que de crença".
BALANDIER, Georges. O Dédalo. Para finalizar o Século XX. Rio de Janeiro, Bertand Brasil; 1999.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Cantiga dos Ais

Um vídeo magnífico que me mostrou o professor José Machado Pais.
Os "ais" da vida com o acento lusitano. Acento não só na fala, mas na lírica inigualável. Quanto a mim, só posso dizer "ai! que saudades"...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Mentiras

A mentira é rizomática...

Memória

Platão já dizia que só aqueles que esquecem precisam da memória. O que parece óbvio, nem vezes o é, de fato. Porque se essa constatação deixa claro que há algum problema com nossa história e que não podemos fugir dela, a necessidade e inevitabilidade da memória mostram que há, antes de tudo, uma necessidade de esquecer. Ainda que esqueçamos involuntariamente, sabemos que quanto mais treinamos nossa memória, mais lembramos.
O que me parece, na verdade, é que esquecemos porque se fossemos capazes de recordar tudo, a vida talvez não valhesse a pena. A memória é um jogo perigoso e deve ser sobre o perigo que ela deve ser estruturada, pois a recordação do perigo é o que afasta sua repetição. Assim como certas flores só desabrocham com o pôr-do-sol, exalando seu perfume por metros e metros, nossa memória deve desabrochar a cada situação, exalando imagens que atingem anos e anos. A cada lampejo, a cada fulgor, essas imagens constroem a memória sobre o tempo presente.
Se se diz que uma mentira contada mil vezes se torna verdade, isso é verdade, acima de tudo porque esquecemos. Se a mentira se tornou em nosso dias um grão que brotará como verdade com o passar dos anos, a memória, e portanto, a história - pois toda memória é histórica - deve ser a praga insistente que, ainda que morra, deixa furos e doenças nas plantas e solos.

P.S: Desculpem se o texto parece por demais um esboço ou se é imageticamente confuso, mas assim como eu tento construir minha memória como um lampejo de imagens, esse texto me veio, também, como um lampejo...

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Jethro Tull

Para mim, há uma frase em uma das músicas do Jethro Tull que só poderia ter sido escrita por alguém com talento poético imenso. Não porque ela é bonita, correta ou algo do tipo. Mas porque, ainda que beirando o banal, não pode ser contradita:

"Life is a long song"

A Espanha Franquista

Segundo Unamuno e a Espanha Franquista:

"Ya se ha oído aqui, en nuestra España, que ser liberal, esto es, hereje, es peor que ser asesino, ladrón o adúltero" UNAMUNO, Miguel de. Del Sentimiento Trágico de la Vida. Buenos Ayres: Longseller, 2004. p. 103.

Embora ele se refira ao papel da Igreja durante a Espanha franquista, essa constatação atesta bem de que modo as ideologias políticas são, em sua maioria, iguais, somente adotando formas e contornos diferentes.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Aquilo que me cansa

Algumas sentenças dos Essais de Montaigne resumem bem as coisas que, atualmente tem me cansado mais:

"En vérité, le mentir est un maudit vice";

"Odi homines ignava opera, philosopha sententia";

"Il fallait s'enquérir qui est mieux savant, non qui est plus savant"

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"Na verdade, o mentir é um vício maldito";

"Odeio os homens cujos discursos são filosóficos e as ações são nada";

"Deve-se se perguntar quem sabe melhor, não quem sabe mais".

MONTAIGNE, Michel de. Essais. Paris: Pocket Classiques, 1998.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O amor é cego, ou será ele burro?

Há algo que eu acho estranho nas exigências de muitas pessoas sobre relacionamentos. Muita gente diz que quer alguém que goste deles da forma como eles são, e não queiram mudar-los. Ora, se estamos sempre insatisfeitos com nós mesmos, por que devemos esperar ou, pior ainda, exigir que alguém se contente ou se satisfaça com o que somos? É um tanto contraditório. É natural que quem goste de nós queira que improvisemos, que mudemos para melhor, não? Porque o negócio é o seguinte: se esperamos e queremos simplesmente que alguém se satisfaça com nós da forma como somos, somos pobres infelizes...

Omelete de Amoras

Para que as experiências voltem a existir, o mundo precisa de mais imaginação e os homens precisam admitir seus sonhos.

Trabalho

Agora que comecei a trabalhar - e sinceramente sinto que realmente tenho trabalhado pesado, mesmo porque é a primeira vez que trabalho - percebi que de fato o trabalho é um martírio. Mesmo assim, conversando com meu "chefe", que é meu amigo, percebi que é preciso aprender a trabalhar. Não só a realizar alguma técnica ou aprender um "metier", mas aprender o motivo pelo qual se trabalha, e compreender o valor desse trabalho. O motivo é muito óbvio: trabalhamos para nos sustentarmos. Mas o valor, esse é mais difícil, pois em certos trabalhos, esse valor é imaterial. Um chef de cozinha tem como recompensa sorrisos de deleite após uma refeição; um professor tem como recompensa o reconhecimento e o avanço e independência de seus alunos - de alguns só, é claro. De uma forma ou de outra, aí é que percebemos que o trabalho, ainda que seja um estorvo, pois ninguém de fato gosta de trabalhar, traz algo de bom, algo que nos ensina a compreender melhor as coisas.
Se eu escolhi me preparar para ser um docente, sei que minha recompensa serão textos publicados e aluno sque aprendam a pensar por si mesmos. Mas sei que isso será suficiente, pois é esse bem imaterial é o objetivo que desejei atingir e que atingido-o, será passado para outros. Além disso, o trabalho pode ser capaz de nos ensinar um pouco de humildade, de reconhecimento, de percepção. Comecei a aprender que não sou mais do que ninguém; e isso não por uma subserviência cristã ou algum ideal utópico, mas porque, no fim do dia, eu trabalhei em equipe, eu vi que outros precisam de mim e que eu preciso dos outros. E que não há como fugir disto.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Dores

Cada um tem as suas dores e só nós mesmos podemos entendê-las, aceitá-las, superá-las ou talvez aprender a viver com elas. São dores de mortes, de amores impossíveis, de arrependimentos, dores de raiva, dores, só isso. Mas, o fato de todos possuirmos dores deve ser o suficiente para nos reconhecermos, para pensarmos um pouco mais nos outros e às vezes, só às vezes, aceitar que alguém nos machuque.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Lições de Paris

"Todo homem cria, sem o saber, assim como ele respira. Mas o artista se sente criar, seu ato engaja todo seu ser e sua penúria bem amada o fortifica".


"Every man creates, without knowing it, just as he breathes. But the artist, feels himself creating, hes act engages all his being and his beloved pain, fortifies him".


"Todo hombre cria, sin saberlo, asi como respira. Pero el artista se siente crear, su acto empeza todo su ser y su bien amada pena lo fortifica".

Fascismo

Eu penso comigo mesmo (não sei se o assunto é algo que possa ser comrpeendido de fato, ou comparado, medido, ou mesmo considerado). Mas eu pensava agora pouco, tomando como exemplo a Segunda Guerra com seus horrores inenarráveis - que a meu ver só podem ser contados por quem os viveu e por isso mesmo os acadêmicos devem deixar de julgar ou reivindicar alguma autoridade sobre o assunto - sobre o que é pior, ou mais absurdo: matar, executar; ou simplesmente deixar morrer ainda que algo possa ser feito.

História Brasileira I



Uma idéia me surgiu enquanto eu escutava à famosa polêmica entre Noel Rosa e Wilson Batista: um estudo historiográfico baseado na querela poderia ser rico o suficiente para contar a história de um Brasil recente, dos anos 30. Ali estão: relações de classe, de gênero, ideologia política e gênese da música popular.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Cuidado! OVNIS!

O que antes era espanto, hoje é riso àqueles que acham que os problemas do mundo não são também problemas deles. Riso daqueles que crêem - pois isso é uma crença, nada mais do que isso - que tudo é pequeno, mesquinho, ou burro demais. Não pequeno, burro ou mesquinho simplesmente, mas pequeno, burro e mesquinho para eles mesmos, ruim demais perto deles, algo que não os merecem. Geralmente acusam os outros de irracionais, pois só nos outros são capazes de enxergar a razão; e se enervam fazendo caretas, porque possuem um senso de humor limitado.
Esses, senhores do bem-viver e da autonomia, vivem como se o desprezo fosse o remédio. Mas o desprezo, o desprezo é um ranço que só em aparência é sinal de ataraxia. Quem não se afeta, de fato, não precisa desprezar; não acha tempo perdido responder às pequenezas, porque não responde para remediá-las, tampouco para fazer-se compreensível. Responde porque é parte de si, porque vê caminhos em toda parte, porque está, inevitavelmente, exposto ao palavrório.
Isso de viver em outros campos, de viver em outros mundos, é metafísica das mais fracas, porque desemboca num ser que vive com medo da morte e precisa, por isso, ter fé na beleza da vida. Metafísica que se pauta por um ser guiado pelo sentimento de que a vida vale ser vivida, quando devia, antes, perceber que é o suicídio que não vale a pena.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Por que não?

E por que não? Por que não, novamente um Reino Unido de Portugal, Açores e Brasil?
Não.. claro que não um reino de fato. Mas não é mais do quue a hora para uma reintegração? Os países de África portuguesa se espelham em nós. Nós, mal ligamos. Os movimentos de identidade negra do Brasil não fazem jus à África. Por outro lado, quando da Revolução dos Cravos, Portugal foi inspirador a muitos intelectuais e artistas brasileiros.
Por que não, então, buscar uma origem comum entre esses países que, por mais que queiram, consciente ou inconscientemente, se distanciar, não conseguem. Por que não nos aproximarmos mais? PArece que há um grande movimento neste sentido, tanto econômico quanto artístico. Mas é necessário que isso entre na própria vida, que isso venha acompanhado de uma vivência que proporcione algo à sociedade, não só aos governos e às elites das mais diversas esferas.

Contribuição à teoria da infância

Brinquedos querem ser brincados. Quando o colecionador os exibe numa redoma de vidro, é porque o potencial que aqueles brinquedos possuíam perdeu-se no tempo, e só pode ser revivido à altura na memória, que deve ser passada às crianças de hoje.

terça-feira, 13 de julho de 2010

A bondade

Uma das coisas que nos ensina a Filosofia é que deve-se admirar a tal ponto a Bondade e a retidão, a busca por aquilo que é certo, que a morte de um único bom deve ser sentida como uma tragédia, como uma perda que não se explica. Ainda que sua morte tenha sido a mais tranquila, na mais avançada idade.

Vazio

Pior do que descobrir que as coisas não tem, por si só, um sentido, é ter que aceitar que por vezes, é impossível também criar um sentido para elas. Cria-se um vácuo entre o que se vê, o que se vive, e aquilo que se pretende. Sentimos nos tornamos insuportáveis até para nós mesmos. As mãos restam, infinitamente, vazias.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

As pessoas

É preciso cuidado. Não se deve esperar nada de ninguém. Isto, por outro lado, significa esperar tudo de todos. Faz sentido. Podemos sempre ser surpreendidos novamente.

domingo, 11 de julho de 2010

Portugal

Guilherme de Almeida tem um livro intitulado O Meu Portugal. Eu descobri também ter o meu. Ainda que não conheça a terra, conheci o povo e percebi começar a ter um certo Portugal para mim. Até tágides eu tenho. Duas!

sábado, 10 de julho de 2010

Pierre Clastres

Mais um texto meu, bem informal desta vez. Proponho aqui explicitar de que modo Clastres caracteriza a questão do poder e a economia nas sociedade ditas "primitivas".

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As sociedades primitivas são assim denominadas por serem sociedades sem Estado, nas quais o poder não se separa da sociedade. Não há, nessas sociedades, divisão entre dominantes e dominados. São, portanto, homogêneas ou, se se quiser, indivisas. A questão do poder nas sociedades primitivas se dá, assim, de forma diferente das sociedades ditas “ocidentais”.
De fato, o chefe, personagem que na teoria antropológica clássica seria o detentor do poder nas sociedades primitivas, segundo Clastres não possui poder algum. Ele é simplesmente encarregado de assumir a vontade que a sociedade tem de aparecer como uma totalidade uma, isto é, ele é o homem que fala em nome da sociedade quando necessário, dadas as circunstâncias e os acontecimentos. O líder primitivo jamais toma decisões por sua própria conta. Obviamente, ao designar um homem como chefe, lhe é dado um crédito mínimo de confiança, garantida pelas qualidades que ele coloca a serviço da sociedade. Essa atenção que é prestada ao chefe, no entanto nada tem a ver com poder, mas sim com prestígio.
Deste modo, as sociedades primitivas se matem como indivisas e sem classes, mas não são, por isso, apolíticas. “Na sociedade primitiva, não existe órgão separado do poder, pois o poder não é separado da sociedade, porque é ela que o detém como totalidade una” (p. 110). O lugar real do poder é desta maneira, o próprio corpo social.
Dando como exemplo os big man melanésios, Clastres mostra que, no cerne da relação de poder, estabelece-se a relação de dívida. O chefe, que será “porta-voz” da sociedade, garante seu prestígio oferecendo em troca seus bens. A partir do momento em que se torna seu líder, o chefe se encontrará em dívida com a sociedade e seu prestígio nunca se transformará em poder, pois é a sociedade que detém, sob a relação de dívida, o exercício de poder do chefe. A dívida age, assim como um regulador. O chefe terá uma dívida para com a sociedade por todo o tempo em que for chefe, mas em troca receberá prestígio, honra, por vezes, mulheres. A questão em si, não é o poder. De fato, como se pode falar de poder se, neste como em diversos outros casos, o chefe é explorado pela sociedade? É por esse motivo que Clastres afirmará que as sociedades primitivas são sociedades contra o Estado.
Não só contra o Estado, mas também contra a Economia. Clastres, prefaciando o texto de Sahlins Age de pierre, Age d´abondance, critica a concepção clássica da economia primitiva como economia de subsistência e que assim o é pelo fato de ser mísera. Na verdade, a economia primitiva não só não é uma economia da miséria como permite também caracterizar a sociedade primitiva como a primeira sociedade da abundância, ou da afluência.
Seguindo o método aplicado por Sahlins em seu livro, Clastres analisará uma realidade econômica: o MPD (Modo de Produção Doméstico), para compreender que toda comunidade primitiva aspira à autonomia completa, do ponto de vista de sua produção. Não o lucro, mas a autonomia. Esse é o ideal autárquico da sociedade primitiva. “O MPD garante [...] à sociedade primitiva uma abundância medida pela equalização da produção em relação às necessidades. Funciona tendo em vista sua completa satisfação, recusando-se a ir além. Os Selvagens produzem para viver” (p.134). Todas as necessidades, nestas sociedades, são satisfeitas. Estruturalmente[1], para Sahlins a “economia” não existe. Tendo em vista apenas a produção de consumo e não a produção de troca, podemos dizer que as sociedades primitivas são sociedades de recusa da economia.
“‘A sociedade primitiva admite a penúria para todos, mas não a acumulação para alguns’” (p. 136).

[1] O grifo é do autor.

Emergência de uma nova Antropologia

A seguir, outro texto redigido por mim baseado na análise de parte da obra de Georges Balandier. O texto, curto, dtém-se principalmente sobre a crítica de Balandier à Antropologia contemporânea e baseia-se principalmente em: Antropo-lógicas; Antropologia Política e; As Dinâmicas Sociais, sentido e poder.
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De acordo com Hegel, em suas Lições Sobre a Filosofia da História Mundial, os homens ditos primitivos se encontram abandonados à margem da história, são como máquinas que funcionam no vazio em sobrevivência anacrônica. Elas desconhecem o trabalho do negativo, ou seja, da transformação temporal. E somente o que não é atravessado pela dúvida e pelo desespero pode fugir da ação do tempo. A China e a Índia forma, para ele, povos que perduraram sem história. Já a Pérsia, tendo sido o primeiro império que desapareceu, foi o primeiro povo histórico, sofrendo com a ruína e a queda, processos para ele naturais.
Os povos históricos são, assim, aqueles cujo negativo emerge em seu interior, nos quais a violência externa não é determinante. Isso significa dizer que nas sociedades sem história, o desaparecimento da civilização é efeito de uma catástrofe que lhe é extrínseca. Sua estabilidade e sua “fraca temporalidade” fazem com que sejam vulneráveis aos arbítrios externos, de modo que o negativo que as destrói vem de fora. A história destas sociedades se firma, assim, como uma “história sem história”, repetição de uma mesma ruína: o novo elemento que substitui o anterior sempre perecerá.
Para Georges Balandier, em Antropo-lógicas, a recusa pela história na análise antropológica, herdada da tradição neokantiana, hegeliana e durkheimiana, foi corrente até a metade do século XX, o que mostra o atraso da ciência em relação à sua ciência irmã, a Sociologia. Por isso, o objetivo principal deste antropólogo será cunhar uma antropologia da modernidade, uma antropologia do atual, uma vez que o ofício do antropólogo - de interpretar sociedades e culturas firmadas na diferença - e a do sociólogo – de apreender a própria sociedade no que esta revela de si mesma nos problemas atuais - entraram em crise na primeira metade do século XX: a Sociologia por não conseguir se distanciar das categorias próprias das sociedades ocidentais industrializadas, com a idéia de ser sempre o regime “que rege a produção que determina o ponto principal do debate”[1]; e a Antropologia por se firmar como pesquisa meramente de sociedades arcaicas, sem notar a relação destas com as sociedades de onde provinham os próprios pesquisadores, fechando os olhos para o diálogo entre si mesma e outros campos de saber.
Desse modo, observando a emergência da antropologia crítica, que insere suas considerações no campo de certo tipo de antropologia fundamental, alguns antropólogos se deterão na questão do trato entre as sociedades desenvolvidas e aquelas ditas arcaicas ou primitivas, observando que este trato não engendra necessariamente, a deserção do “atual”. O primeiro destes antropólogos havia sido Franz Boas. Retomando esta atitude, de revisão e intersecção entre antropologia e outras ciências e saberes, a fundamentação de uma antropologia do moderno será traçada, sendo que o primeiro passo será o de uma definição e intitulação coerente daquilo que seja a modernidade. Esse conceito, reformulado, trará a idéia de que as sociedades tradicionais e aquelas chamadas de históricas, não são como até então haviam sido interpretadas, contrárias, sendo uma o negativo da outra.
Balandier se preocupa, neste ponto de vista, com a questão da colonização, na qual se efetivam os contatos entre as sociedade tradicionais e as modernas, pois por eles se consolidarão os dinamismos e os movimentos históricos que transformam os sistemas de instituições das sociedades, dos quais a Antropologia Política deve se encarregar de interpretar. Ou seja, é pelo contato entre as sociedades tradicionais e modernas, que ambas se transformarão, sem necessariamente se esfacelar, mas criando algo novo e é dessas transformações que o antropólogo deve se responsabilizar. Por isso, o estudo das sociedades tradicionais necessariamente perpassa a reflexão do estatuto da modernidade.
È estudando a África negra que Balandier nos mostrará a evidenciação das conseqüências políticas imediatas da situação colonial. Essas conseqüências serão divididas em cinco características principais:
a) A desnaturação das unidades políticas tradicionais – O Reino do Congo, por exemplo, foi teve seu território cortado em pedaços no momento das partilhas coloniais com o Tratado de Berlim;
b) A degradação pela despolitização – Transformam-se os problemas políticos em problemas técnicos, dependente da competência administrativa;
c) A ruptura dos sistemas tradicionais de limitação do poder – Falseia-se a relação e as obrigações recíprocas já não parecem tão nítidas. As relações de poder, opinião pública e religião são perturbadas pela existência do fato colonial;
d) A incompatibilidade dos dois sistemas de poder e de autoridade - o fato colonial introduz forçosamente a existência de outros tipos de relação de poder e subordinação, o que impele à racionalização, entendida weberianamente, o modo de governar tradicional;
e) A dessacralização parcial do poder – O poder do soberano e dos chefes tradicionais se legitima antes por referência ao governo colonial que por referência aos antigos processos rituais.
Embora essas características possam diferenciar entre as sociedades, o ponto principal é que a colonização e o contato entre sociedades históricas e a-históricas se deu geralmente de modo à subjugar um ou outro tipo de organização social. De modo que é

“pela modificação das estratificações sociais que o processo de modernização, aberto no momento da intrusão colonial, influi indiretamente na ação política e suas organizações. Ele põe a funcionar s geradores de classes sociais constituídas fora do quadro estreito das etnias”[2].

De modo geral, é observável que na maioria dos países sujeitos à colonização e, posteriormente, à descolonização, os efeitos acumularam-se de modo a degradar em demasia os poderes antigos para que estes pudessem se remodelar sob um aspecto moderno e à incapacidade de provocar além dos limites étnicos, as mudanças que fariam da nova estratificação social o único gerador da atividade política moderna.
Acima de tudo, o fato colonial transforma ambas as sociedades. Correntemente, a mais afetada será aquela de molde tradicional. Não obstante, a noção de “tradicionalismo” ainda carece de uma definição precisa. Geralmente essa noção é definida como continuidade, enquanto a modernidade é ruptura; define-se pela conformidade a regras imemoriais, geralmente míticas, transmitidas de diferentes formas. A análise deve se voltar deste modo, para a configuração atual do que seja o “tradicional”, uma vez que aquelas sociedades tradicionais sofreram transformações das mais diversas com o fato colonial. Só deste modo, a Antropologia Política dará conta de uma análise que preencha as lacunas deixadas pela colonização e pela descolonização. A primeira expressão, das quatro apontadas por Balandier, da configuração do tradicionalismo atual é:
a) o tradicionalismo fundamental - aquele que tenta salvaguardar os valores das organizações sociais e culturais garantidos pelo passado;
b) o tradicionalismo formal – geralmente coexistente com a figura precedente, definindo-se pela “manutenção de instituições, de quadros sociais ou culturais, cujo conteúdo se modificou; da herança passada, só se conservaram alguns meios – as funções e as finalidades modificaram-se”[3];
c) o tradicionalismo de resistência – quando existiu, serviu de anteparo ou camuflagem que permitia dissimular as reações de recusa frente ao colonizador. Frequentemente ocorreu no plano religioso;
d) o pseudotradicionalismo – no qual a tradição manipulada torna-se o meio de dar sentido às realidades novas, ou de exprimir uma reivindicação marcando a dissidência em relação aos responsáveis modernistas. Conjuga-se intimamente com a expressão precedente.
Aliando estes componentes, uma análise antropológica consistente, se dá pelo diálogo entre o tradicional e o moderno, do ponto de vista das defrontações políticas que se expressam, não exclusivamente, de fato, por esse embate. Assim o fazendo, a Antropologia Política deve determinar as unidades e níveis de inquérito em que a análise será suscetível de atingir uma eficácia científica crescente. Balandier reconhece algumas destas unidades:
a) a comunidade aldeã – Constitui uma sociedade reduzida, como fronteiras precisas, nas quais se reconhece com nitidez a defrontação entre tradicional e moderno, sacral e histórico. No seio dessas comunidades há uma cisão entre o domínio da vida interna – dado pela tradição – e o da vida externa, que organiza as relações múltiplas estabelecidas com “exterior” – ande se impões as forças e os agentes modernos. Esses fatores modernos são geralmente constatados alheios às sociedades aldeãs. Não obstante, essas comunidades são as que explicitam melhor a dinâmica em que se determinam, em estado nascente, novas estruturas em que as incidências da ação política moderna se manifestam de maneira mais imediata. São as unidades de pesquisa mais pertinentes, de acordo com Balandier;
b) o partido político, instrumento “modernizante” – A insurgência de partidos representa a forma de organização de Estados nascentes ou renascentes. É o primeiro dos meios de modernização e é quase geral nas sociedades descolonizadas;
c) a ideologia, expressão da modernidade – a ideologia política surge, no caso da África negra, estudada por Balandier, no momento revolucionário e de mudanças profundas das sociedades, colocando-se sobre as ruínas dos mitos. Geralmente alimentam projetos de construção nacional, marcadas pelas reações à situação de dependência. Atua como um new deal emotivo, dividindo-se num discurso destinado às elites políticas e intelectuais e num outro discurso de adaptação das palavras da tradição às populações camponesas e às camadas sociais menos marcadas pela educação moderna. Levada ao extremo, essas ideologias assumem aspectos utópicos e milenaristas.
São essas ideologias que constituem, para a Antropologia Política um terreno de investigação rico de problemas mal elucidados. É essa trilha que nos interessa, que nos abre a possibilidade de estudar aquilo que o mito tradicional encerra de ideologia política e aquilo que as doutrinas políticas encerram de mito. É esse o ponto de intersecção que nos chama para a não contrariedade total entre sociedades modernas e sociedades a-históricas. “Esse problema é o da dialética permanente entre tradição e revolução”[4].

[1] BALANDIER, Georges. Antropo-lógicas. São Paulo: Cultrix, 1976. p. 241.
[2] BALANDIER, Georges. Antropologia Política. São Paulo: Difusão Européia do Livro, Editora da Universidade de São Paulo. p. 155.
[3] BALANDIER, Georges. Antropologia Política. Op. Cit. p. 160.
[4] BALANDIER, Georges. Antropologia Política. Op. Cit. p. 171.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

"O brasileiro lá no estrangeiro..."

Como me dão raiva os repesentantes da cultura!
Aquelas menininhas que no estrangeiro fazem questão de mostrar que são brasileiras, assim como aqueles moleques que arranjam uma bola para mostrar o que é que sabem.
Como me dão raiva esses!
O brasileiro no estrangeiro parece fazer questão de mostrar, em sua maioria, que é um povo feliz, alegre, simpático, que sabe viver!!! Por isso é "samba" pra cá, futebol pra lá, galanteios, rebolados e remelexos.
Me faz pensar em como a psicologia é nessária para que se entenda esse povo. Parece que ronda no brasileiro uma sídrome de inferioridade, provavelmente por conviver com tanta pobreza e miséria e se culpar por sua preguiça macunaímica que o leva à inação. O brasileiro precisa, masi do que muitos, mostrar que é feliz, mostrar que, apesar de tudo, "não desiste nunca", não morre na praia.
Por isso cantam, precisam mostrar aos outros, que também são capazes de conhecer a si mesmos, à sua própria cultura, e mostrar que têm muito a ensinar. É triste, na verdade. É triste que tenhamos deixado morrer tanta coisa, criando uma mentalidade amorfa, uma identidade vazia. Como eu já disse em outro texto, a identidade é ainda necessária. O brasileiro confronta este problema onde quer que vá. Quando viaja, por exemplo, para mostrar que é brasileiro, usa o futebol e a música, põe um gorro do "curíntia" e uma calça apertada.
É como na Copa do Mundo. Todos param para ver o Brasil. Parece que é a única grande chance que temos de mostrar que podemos ser grandes, que temos, também, beleza e democracia, que sabemos o que é arte e alegria.
A verdade é que o brasileiro não está contente em ser ele mesmo.

O próximo Brasil

Será, então, que à medida em que um povo fica mais rico, cresce, por assim dizer, ele também se desenvolve?
Se o Brasil tem se tornado um país de classe média, porque o poder aquisitivo das pessoas aumentou, por outro lado não evidencia uma melhora efetiva na figura da sociedade. A educação continua a mesma, as moradias quase não mudaram, as universidades públicas continuam send para estudantes de escolas privadas, as cotas não são justas e o discurso racial volta a aparecer. Quanto mais rica a sociedade parece estar ficando, mais estratificada se torna. A moralidade que começa a rondar o país, legitima o desentendimento entre as esferas diversas da população. O que antes era um problema de resolução econômica, como a questão da improvisação urbanas nas periferias, por exemplo, torna-se moral.
O CAPITALISMO NÃO É MORAL!
O que parece estar acontecendo no Brasil, é a divisão entre aqueles que se sentirão confortáveis com o Governo Dilma, pois seu antecesor conseguiu manter a classe média como classe média e subiu o padrão de vida dos pobres, e aqueles que se opõem a isso, porque mantiveram seu status, mas viram outros ascender.
A mim, o que me espanta é que o povo parece estar deliberadamente abrindo mãos do pouco poder que tem nesta democracia de merda. Estão todos satisfeitos. E quando estamos satisfeitos, porque mudar alguma coisa? Todos consomem e isso parece ser o suficiente para que se viva bem.
Óbvio, isto é importante. Mas uma classe média não se cria de uma hora para outra. Se isso ocorreu aqui, é porque muitas soluções foram dadas a curto prazo. Que isto se mantenha, mas que se resolvam problemas de ordem maior agora como educação e moradia, sobre tudo. O Brasil contradiz a idéia de que quem dá pão dá educação. Uma sociedade sem educação é uma sociedade incapaz de se manter, inclusive.
Se algo não for feito, se nada mudar a moralidade que ronda os discursos políticos, que ronda a imagem que se tem feito disto aqui - pois em nenhum outro lugar tem se tomado a imagemcomo a própria realidade - este país se tornará um país de brutos e bestas, que só comprovará a existência da massa. Um país de zumbis e amebas, que não sabe pensar, que não sabem o que fazer da vida.
Mas, pensando bem, talvez é isso que se queira não é? Ausentar-se de qualquer responsabilidade, outorgando a responsabilidade toda ao governo. Deixando-nos controlar deliberadamente.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Mais uma ilógica...

De novo sobre a Antropologia, indiretamente, eu me pergunto se a postura que se adota frente ao preconceito seria a correta. O que se vê atualmente, principalmente no que diz respeito à educação das crianças, é a imposição de um discurso politicamente correto vago. Não se deve ter preconceitos porque ter preconceito é algo errado. Muito bem, mas porque é errado? A essa pergunta, dificilmente se tem resposta, ainda mais porque as crianças, principalmente, dão ouvidos a um preceito moral, mas observam exatamente o oposto. Não se pode esperar que todos sejam antropólogos e entendam que raças, por exemplo, não significam nada.
Mas o discurso politicamente correto é institucionalizado. E não se sabe o porque de suas prerrogativas. Há muito tempo, sabemos que aquilo que é proibido é mais gostoso, desperta curiosidade, desafia. O que se faz hoje é desproibir o proibido, é possibilitar aquilo que aparentemente é errado e acima de tudo, com uma certa normaildade. Educa-se para a falsidade, pois há uma dissonância entre a fala e a ação, entre o significante e o significado. Deve-se pregar o fim dos preconceitos, mas caso se aja preconceituosamente, só certifique-se de que ninguém saiba.
O preconceito é uma realidade que, além de tudo não se esgota na compreensão de sua ilogicidade. Há pessoas que são preconceituosas simplesmente porque querem, é sua via de escape; desconta-se em algum tipo aquilo que está guardado.
Talvez, ao invés de se impor a boa aparência de se ser uma pessoa sem precoceitos - porque no fim, isto está intimamente ligado à aparência do povo, que deve parecer liberal e compreensivo - deva-se ensinar que APESAR dos preconceitos, não é certo que, em relação ao outro, deva-se agir passionalmente. Isso se dá por uma educação para a ética, e não por uma educação para a moral. Senão, cada vez mais, o que se cerceará é a própria liberdade do agir, que já se iniciou há décadas, e que, sabe-se muito bem, se dá pelo cerceamento do pensar.

Antropo-ilógicas

Claro, as identidades são criadas, inventadas, cheias de interesses. E é assim que deve ser. O que não se pode é deixar que sejam criadas ao bel-prazer seja por governantes, ou pelo próprio povo (que dificilmente legitima algo conscientemente). Se há críticas em direção à impossibilidade de uma idetidade em tempos atuais, porque continuamos sendo o país do futebol? Porque até os mairoes dos anarquistas e marxistas "se rendem" à beleza do esporte? Porque de alguma forma, algo nos impele a dizermos que somos brasileiros. Um bom anarquista e um bom marxista sabe que isso não é inevitável simplesmente por sermos catalogados e fichados, por vivermos sob um Estado chamado Brasil, mas porque compartilhamos símbolos e sinais, linguagens comuns a todo um povo, que faz com que a congada e o maracatu nos sejam dançáveis, com que Jorge Amado e Castro Alves nos sejam legíveis, com que Cartola e Gonzagão nos sejam audíveis.
A questão da identidade está para além das fronteiras políticas. Se é óbvio que a identidade é algo criado, deve ser sim esforço de antropólogos a manutenção e a recriação desta identidade. Mas é chegada a hora de tomar partido. A aparência que se tem é que o santropólogos são meros observadores. Limitando-se a constatar o que é feito em certas comunidades - feitos, em sua maioria, de forte cunho identitário, como grupos urbanos das periferias - a antropologia perdeu seu caráter de não-domesticação; recusa-se a ir além daquilo que é dado. Para lá do que é visto, não há mais questionamento. Não se toma partido.
A antropologia não deve se perder em apologias à igualdade e à justiça social, às instituições. Antes, ela deve ir além do que é dado; deixar de lado o como das coisas, e investigar o porque. Não basta investigar de que forma as coisas se dão, mas porque elas se dão. A antropologia compartilha exatamente este caráter indomesticável com a Filosofia. Ela se recusa a dar-se por terminada.
O fato de vermos "tribos" urbanas não deve se limitar a observar o que essas tribos pensam de si mesmas, ou como elas se vêem. Isto em grande parte é tarefa da psicologia. A antropologia deve é reivindicar uma atitude política que a possibilite inclusive criticar as atuais conformações culturais deste país em desenvolvimento. Muitas vezes, quando há crítica, esta sempre surge em momentos de violência: skinheads que espancam um jovem gay; universitários que espancam um jovem negro. E a antropologia se perde entre a sociologia e a psicologia social, ou a psico-pedagogia; torna-se uma área nebulosa que não possui identidade alguma.
Mas talvez seja esse mesmo o problema. Assim como as identidades só existem se inventadas, a Antropologia parece ter se recusado a criar sua própria identidade, ou a assumí-la. Ao invés de se render à crescente especialização imposta às ciências, a Antropologia devia se reinventar como política, capaz de pensar para além de sua "ciência". Se oficialmente ela tem se declarado tão aberta, tão livre, como se dispota e todo e qualquer diálogo, o que fez de fato foi abrir mão de seu próprio discurso.
Talvez eu esteja sendo duro demais, mas o que tenho visto na Antropologia universitária é isso: a maior das ciências de gabinete. Mesmo quem vai à campo, volta para sua escrivaninha e teoriza algo que termina por não dar conta de qualquer realidade. E quando se assume a parcialidade, a palavra de ordem é "Toda a cultura é válida!", porque a cultura vem do povo. Mas sabemos que não é bem por aí, não é?
A questão é, depois de Gilberto Freyre, depois de Sérgio Buarque e Paulo Prado, depois das pesquisas de Mário de Andrade e do trabalho de Roquette Pinto, Darcy Ribeiro, o que se criou de novo na Antropologia? Que papel essa ciência tão nobre assumiu para se pensar o Brasil? A Antropologia devia voltar a trabalhar as questões maiores de nosso país, a começar por uma, sem a qual a grande gama de trabalhos antropológicos deixa de fazer sentido: que raios, é, afinal, o Brasil?
E viva o povo brasileiro...

segunda-feira, 28 de junho de 2010

domingo, 27 de junho de 2010

O medo

Esconder de nós mesmos o medo é o pior erro que podemos cometer. O medo, quando existir, deve ser semelhante a um vício a ser vencido.

Do gesto

Um gesto, por mais simples que seja, pode trazer exatamente aquilo que precisamos, ainda que o saibamos impossível: a suspensão do tempo de uma vivência que não queremos que cesse jamais...


terça-feira, 22 de junho de 2010

Um desabafo futebolístico

Os franceses cunharam a idéia de fraternidade tendo em vista sua aplicação ao mundo todo. No fim, um francês só é amigo mesmo de um francês. Faz sentido. Que chamem um português de povo irmão, ou angolanos, moçambicanos, guineenses, tudo bem. Falam a mesma língua, compartilham símbolos e signos comuns.
Mas não. Estimula-se a idéia de que eu tenho que se irmão de argentino! Tem cabimento? Não, não é povo irmão, não é amistoso. Podemos nos dar bem, até certo ponto, mas são essas pequenas coisinhas do dia-a-dia que faz com que se adote cada vez mais, um discuros cultural que não faz sentido algum. É por isso que há um bando de brasileiros não só torcendo contra o Brasil, mas pelo Maradonna. O pior ainda, é quando se vê toda a intelectualidade do futebol, os sociólogos de plantão, achando bonitinho o preconceito do anão viciado. Adotamos o discurso politicamente correto. Não se pode xingar, brigar, mas quando o anãozinho chama alguém de "preto", "senhor moreno", aí é só engraçado, chistoso. O jogo desonesto, a catimba, naquele lado é bonito: vale tudo pra ganhar. Eu não acredito naquele papo de futebol como ópio do povo, que o futebol aliena e tudo mais. Mas, sendo algo que desperta a paixão das pessoas - pois no jogo elas são capazes de deixar de lado suas maiores convicções em nome de uma dominação simbólica - o futebol é ótimo para que vejamos o que, realmente, as pessoas pensam. O que se vê de apoio a alguém como Maradonna, é espantoso. Porque o que se vê não é uma elegia ao seu futebol, ams uma adoração à sua própria pessoa, àquele jogo sujo como "algo necessário", um futebol no qual o fim justifica os meios, de fato. E isso só me pode parecer preocupante.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Uma do Ghiraldelli

Pois eu tinha dito que o Moderno já nasce ultrapassado... eis uma do filósofo Paulo Ghiraldelli:

"Moderno é tudo que envelhece mais depressa que qualquer outra coisa".

http://ghiraldelli.pro.br/?page_id=60

sexta-feira, 18 de junho de 2010

O homem induplicável

Eis que hoje, durante o intervalo entre um café e outro, ouvi por terceiros que Saramago havia morrido. Recusei-me a acreditar de início; achei ter ouvido errado. Infelizmente não.
Nunca procurei ter ídolos, mas hoje me pergunto até que ponto admiração não é também, idolatria. De qualquer modo, esta discussão não tem lugar aqui.
Este texto deve se tratar de uma despedida, de uma homenagem a um escritor que tem cada vez mais a ensinar e cuja profundidade e significado da obra só poderá começar a ser compreendida daqui a alguns anos.
Saramago, segundo a maioria dos que os conheceram, era um cavalheiro. Era gentil, ainda que defendesse veementemente suas idéias e possuísse um ar sério. Isto eu mesmo pude sentir, numa primavera de 2005 por ocasião do lançamento de As Intermitências da Morte no SESC Pinheiros. Eu tremia ao entregar eu livro para que ele o autografasse e engasguei na tentativa de agradecer. Mas pude olhar em seus olhos e apertar suas mãos firmes - impressionantemente firmes para um senhor de já 82 anos de idade -e sinceramente duvido que me esquecerei de seu breve "obrigado" dito olhos nos olhos. Austero porém doce.
Em tempos de fins de utopias, Saramago, aquele velho comunista, nos mostrou que a vida vai além das ideologias e crenças. Sua própria vida foi o palco de sua literatura: um homem que na medida possível do humano, foi ético.
Acima de tudo, acredito que Saramago tenha deixado um legado para a juventude. Sua obra será compreendida à medida em que nós jovens, que vivemos com toda a intensidade o que mais tarde será conformismo, a conservarmos. A literatura de Saramago foi o reencontro da experiência do homem maduro com o caráter destrutivo do jovem. Se é necessário criar um sentido para a vida, que seja o de vencer a morte, que como o próprio Saramago dizia, só se alcança pelo amor.
Uma vez, Saramago disse em O Homem Duplicado, que nem todos os verbetes de todos os dicionários conteriam metade dos termos que precisamos para entendermos uns aos outros. Por isso, na obra deste materialista, marxista, comunista, os sentidos foram tão exaltados e sempre, entre os homens, algo ficou por ser dito e que, exatamente por isso, foi compreendido.
Nunca houve algo novo na crítica de Saramago. Nada do que ele tenha dito já não era óbvio, perceptível e claro. A cegueira, a prisão na caverna platônica, a ilusão dos sistemas políticos. Seu mérito está na forma em que tratou disto: sem sistemas, sem retórica, sem falácias. Exatamente por ser um romancista, por ser um ficcionista, criou livremente e expressou com toda clareza aquilo que parecia ter ficado para trás. Não à toa, escreveu um Manual de Pintura e Caligrafia. Sua própria obra é uma pintura: cria-se a cada golpe de pena, uma sobre a outra e o tod é mais do que a soma das partes. Restam em seus romances muitas coisas a serem ditas e por isso suas histórias não se esgotam. Saramago não quis expor a realidade, mas sua própria obra é a realidade.
Poderíamos criticá-lo por ser a certo ponto antiquado: vale-se de categorias antigas como dignidade, direitos, honestidade. Se ele buscou tais coisas em sua vida, foi porque não via o erro do projeto humanista, mas a completa inexistência real de séculos de planejamente por sociedades mais justas, nas quais as pessoas pudessem usufruir de suas próprias vidas.

"As misérias do mundo estão aí, e só há dois modos de reagir diante delas: ou entender que não se tem a culpa e, portanto, encolher os ombros e dizer que não está nas suas mãos remediá-lo — e isto é certo —, ou, melhor, assumir que, ainda quando não está nas nossas mãos resolvê-lo, devemos comportar-nos como se assim fosse".
La Jornada, México, 3 de Dezembro de 1998
Saramago deixa-nos um legado imenso, de valor não só literário como ético. Em dias em que se questiona o fim da literatura, das artes, do sujeito e de todas as categorias modernas, Saramago nos mostrou que há ainda, algo a dizer, mesmo que seja pelo silêncio.
Foi-se o homem, fica a obra. A morte é só a morte do organismo. O resto ainda pulsa.
Cabe a nós não deixarmos que também a obra se vá. É nossa a missão de que não se deixe ir a luta incessante de, a cada dia, a cada minuto, abraçar com todo o amor do mundo a vida com todo seu peso, longe do descaso e da opressão, da razão cega e das paixões burras, da caverna e das sombras.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Os filósofos

Parece que há cada vez menos filósofos. A estratificação do campo da filosofia, a necessidade burocrática de especialização cada vez maior faz com que haja pensadores políticos, estetas, metafísicos, mas poucos filósofos. Não é nada nova minha afirmação, mas o que vem me espantando é o fato de cada vez menos, aqueles que estudam filosofia não viverem a própria filosofia, isto é, não viverem de acordo com suas convicções filosóficas. Como pode-se chamar de filósofo alguém que se declara marxista em seus textos, por exemplo, mas é incapaz de viver de acordo com a ética que esboça textualmente, de acordo com os preceitos daquilo que crê ser um pensar correto sobre a vida, pois a filosofia não é nada mais do que isso: um pensar sobre a vida.
Não que, se formos filósofos seremos corretos sempre, nunca erraremos. É necessário errar, inclusive propositalmente. Pomos à prova nossas crenças, e reformulamos o pensamento e o agir. A questão é que acho inaceitável achar que, em alguém que busca ser filósofo, acreditar-se que há uma separação entre aquele fulano que dá aula, fulano acadêmico, pesquisador, e o mesmo fulano pai, amigo, marido, boleiro de domingo. O filósofo deve sim assumir uma tarefa dura de viver conforme suas "crenças" filosóficas caso ele acredite que a filosofia ainda tem algo a ensinar.

Da Arte ou Primeira incursão na Estética...

Atualmente, há uma discussão sobre a possibilidade da arte. Existiria ainda alguma arte? Seria a pintura, ainda, possível? Estética não é minha especialidade. Bom, na verdade um recém-formado não é especialista em nada, mas, de qualquer modo, o que me parece é que a arte sim é possível. Acontece que, a meu ver, toda arte verdadeira não é nada mais do que uma narrativa. Assim sendo, ela deve remeter a seu tempo, ainda que traga consigo toda a história.
No caso da pintura, se se nota um esgotamento de significado acredito que seja porque a própria arte muda de forma. Se há um descolamento da arte em relação à sociedade, é porque a transformação da arte em consumo destituiu a arte de qualquer caráter capaz de estimular uma reflexão ou de gerar reconhecimento entre autor e receptor. A arte se tornou, assim, meramente um produto de admiração, reduzido a seu valor de mercado, a seu valor, podemos dizer, "de exposição".
Perguntar se a arte ainda é possível é necessariamente reivindicar uma função social da arte, pois se já não é mais importante nos perguntarmos sobre a "forma" da arte, sobre o processo de criação da arte, então o que perguntamos é sobre um certo "papel" da arte. Uma vez que não há nada novo na pintura, que não há mais criação, e que os artistas são tão dispensáveis partir do momento em que deixam de ser uma novidade - assim como o trabalhador braçal, quando se esgota sua força - porque a arte deveria, de fato, "criar" algo novo? Ela deveria mudar? Deveria ainda proporcionar novas percepções ou novas experiências? Novas técnicas artísticas são criadaas à todo momento e se isso não é o suficiente para se dizer que a arte continua viva, então é porque necessariamente se reivindica uma arte que transforme seus receptores, que estimule uma reflexão, que tenha, assim, um cunho social.
Se, então, assumimos a idéia de que toda arte real é deve ser uma grande narrativa, a exigência de um reporte às realidade sociais fica facilitada: as artes mudam de forma, passam a residir em outros modos de expressão estética. As graphic novels e o grafite são expressões disto. A emergência de uma forma de romance que alie imagem gráfica, desenho, e palavra escrita, expressa o universo misto no qual o mundo atual se encontra. Ao ler uma história em quadrinhos cuidadosamente desenhada, de cunho político muito mais forte do que muitos romances atuais, as pessoas se reconhecem. Se explica assim o enorme sucesso de novelas como V for Vendetta - com a qual se poderia ensinar Locke - e Watchmen - com a qual se poderia dar uma aula de história sobre todo o Pós-Guerra até a Queda do Muro. O grafite, por outro lado, reporta as pessoas à sua relidade: o preenchimento de espaços urbanos vagos com cor, com figuras da própria cidade.
Buscar uma arte que não seja mercadoria, não faz sentido. Tampouco faz sentido reivindicar uma arte realista. Mas deve-se buscar sim uma arte que reporte o receptor ao mundo, que o estimule a pensar, antes de tudo. Não pensar em transformação, em práxis, mas que estimule a reflexão sobre aquilo que lhe foi retratado. A exposição de grafites no espaço público já demonstra seu caráter social. Há grafites logo ali no túnel da Avenida 23 de Maio para que todos vejam. Que retratem um grande monstro sem cabeça, Don Pedro I - como na Avenida Dr Arnaldo - não importa. Está à disposição para que as pessoas os observem e em seguida, observem seu entorno. Isto é muito mais propenso a uma reflexão do que a exposição aberta ao público num museu.
Sendo uma linguagem, as artes são reformuladas de tempos em tempos, num processo de longa duração, elas se consolidam em algo novo de tempos em tempos. Mas assim como as realidades sócio-políticas são naturalizadas, também a linguagem é naturalizada e a damos como dada, como algo que "sempre esteve ali" e não percebemos as reviravoltas que ocorrem.
Deste modo, a arte muda de forma, pensar em pintura hoje como uma "arte real", talvez não seja mais possível. Talvez ela sobrevia, mas tenha passado sua época de "grande arte". Uma das obras de Vera Martins me fez pensar nisto. Em certo momento de sua produção, Vera Martins desfiava telas, e as apresentava sobrepostas formando uma rosa que desabrochava em diversas fases. Isso remete não só, talvez, a seu processo criativo como artista, mas para além, disto, à transformação da pintura em outra coisa, em escultura talvez. A apresentação de telas inteiramente desfiadas, sobre suportes quadrados, lembrando egunguns, espíritos perambulantes, mostra, para além de sua intenção explícita, que a pintura, ainda que não tenha morrido, simplesmente sobrevive. É necessário buscar a arte em outros lugares, posi ela já ocupa outros lugares; já a levamos a outros lugares. Mas não nos demos conta.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Israel, outra vez

A atitude de Israel de invadir os navios de ajuda humanitária em águas internacionais veio para sacramentar as verdadeiras vontades do país. Primeiramente, os israelenses consideram-se no direito de declarar inimigos em todas as partes, mas exige que todos abracem sua causa. O pirateio de navios que levavam comida, brinquedos e roupas para Gaza, mostra que as intenções verdadeiras de Israel não param na autonomia de um Estado, mas na realização de um projeto expansionista que pretenda abranger provavelmente do Rio Tigre ao Mar Vermelho. A atitude covarde, hipócrita e prepotente de Israel serve, além disso, para mostrar até que ponto a história recente da humanidade foi transformada em tabu. Israel é um Estado que usa a predicativa de, por ter sido formado pelo povo perseguido no holocausto (ou melhor, um dos povos, dos outros ninguém lembra), ter a priori, todos os seus atos justificados; sempre foram e sempre serão vítimas de "anti-semitismo". Assim justificam seu anti-arabismo e todos seus outros preconceitos. Valem-se de um passado que já não pode ser compreendido (afinal, os horrores do holocausto foram muito grandes para serem entendidos ou memso concebidos), para justificar todos os seus atos. Não consigo entender, no entanto, como isso pode justificar soldados usando camisetas com piadas sobre matar duas pessoas com uma só bala atirando numa grávida palestina.

Tudo, simplesmente tudo, parece ser justificável pelo passado. A história começa a se repetir como tragédia. As vítimas de ontem são os vilões de hoje. Israel é um Estado teorrorista e assassino. Não me espantaria se logo, crimes novos forem descobertos em Gaza ou na Cisjordânia: estupros, imolação e etc.

E o mais engraçado é que eles ainda usam como princípio de suas atitudes a religião, ou seja, tal como os Estados islâmicos, nos quais todos vêem tantos demônios, Israel, fundando toda uma nação num princípio religioso, recusa-se a aceitar leis internacionais; dá como divinas suas leis, prega que as terras são suas por direito divino. Porque temos tanto medo de reconhecer que eles estão hoje, fazendo o mesmo que os nazistas fizeram? Por medo de reconhecer novamente toda a barbárie de 70 anos atrás? Ou por medo deles? Por medo de sermos presos ou chama-los de nazistas? O sionismo israelense é o nazismo do Século XXI: assassinato em massa, guetos reclusórios e, aciam de tudo, se acreditam que são mesmo o povo escolhido, é porque provavelmente, os hebreus creiam-se uma raça superior, mais pura, mais... alguma coisa em relação às outras "raças".

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Outra...

Uma do Paulo César Pinheiro.

"Eu sozinho sou mais forte
Minh'alma mais atrevida.
Não fujo nunca da vida,
Nem tenho medo da morte.

Eu sozinho de verdade,
Encontro em mim minha essência
Não faço caso de ausência
E nem me incomoda a saudade.

Eu sozinho em estado bruto
Sou força que principia,
Sou gerador de energia
De mim mesmo absoluto.

Eu sozinho sou imenso,
Não meço nunca o meu passo
Não penso nunca o que faço
E faço tudo o que penso.

Eu sozinho sou a esfinge
Pousada no meio do deserto.
Que finge que sabe o que é certo
E sabe que é certo o que finge.

Eu sozinho sou sereno
E diante da imensidão
De toda essa solidão,
O mundo fica pequeno.

Eu sozinho, em meu caminho
Sou eu, sou todos, sou tudo.
E isso sem ter, contudo,
Jamais ter ficado sozinho"

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Os Anos 60

O que me encanta nos movimentos jovens dos anos 60, na verdade nos movimentos juvenis dos EUA dos anos 60, é que eles foram capazes de reatualizar, de redefinir o jovem no mundo. Não foram movimentos maoístas ou stalinistas ou marxistas ou de qualquer outro tipo de "ismo", embora, é claro, as ideologias políticas e as filosofias das mais diversas permeassem os ideais. Mas no fundo, os movimentos foram reivindicações de outras instâncias, mais profundas. Era uma movimentação a favor da sensibilidade, da compreensão - não do "tudo está sempre bem" dos "hippies" atuais que acham que compartir um baseado com um mendigo é fazer algo por alguém - do diálogo, da política feita entre os corpos.
Em sua aparente isenção da sociedade, por parte dos hippies, ou do engajamento pela igualdade dos direitos civis e pelo fim da Guerra do Vietnã por parte dos estudantes universitários e a deserção por parte dos garotos em idade militar. Aquela sociedade tão criticada, tão vil aos olhos do mundo, tão imperialista e todos os outros adjetivos que os marxistas ortodoxos adoram reproduzir para pintar o demônio em alguém, foi a única sociedade que possibilitou à filosofia aquela que é provavelmente a única utopia da atualidade, pensada por Marcuse - independentemente das centenas de críticas possíveis - e muito bem resumida nas últimas linhas de Eros e Civilização:
"Os homens podem morrer sem angústia se souberem que o que eles amam está protegido contra a miséria e o esuqecimento. Após uma vida bem cumprida, podem chamar a si a incumbência da morte - num momento de sua pópria escolha. Mas até o advento supremo da liberdade não pode redimir aqueles que morrem em dor. É a recordação deles e a culpa acumulada da humanidade contra as suas vítimas que obscurecem as perspectivas de uma civilização sem repressão"
Foi contra isso que essa geração levantou sua voz: a impossibilidade de uma civilização não repressiva. E a importância de uma utopia é vital, pois é o projeto de uma civilização que tem materialmente quase todas as condições para se realizar.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Da Pintura

Como olhar um quadro e interpretá-lo? Deve-se perguntar se a pintura é meramente uma representação, ou melhor uma imitação de algo ou se é, ela mesma, uma reflexão, um poema, um ensaio. Como, no entanto, identificar isso? como saber primeiro: se as intenções do artista eram a de refletir com a criação da obra; segundo: se independentemente disso, a obra expressa por si uma reflexão.
Merleau-Ponty dizia que a pintura não era uma representação, era a coisa mesma. Assim, quaquer quadro deve ser visto como ó próprio objeto retratado para, a partir daí, revelar um certo "espírito" daquilo que está ali. Técnica, objeto, tema, são todos temporais, históricos. Hoje, se um artista representa o século XIX, ele o representa quase que sempre a partir de seu próprio tempo. Quando Oiticica criou seus penetráveis, expôs ali toda uma concepção contemporânea e brasileira de espaço e a forma de se compreender nesse espaço mesmo. Assim também deve ser a análise de um quadro. Se se representa uma favela, independentemente da intenção autoral, ali pode está a favela tal como ela é, podendo estar presente nela toda a ideologia de um discurso de estetização da pobreza ou de denúncia da miséria. Uma vez que a arte não possui mais papel político, a reflexão sobre ela é fundante para um princípio de política.