quinta-feira, 7 de junho de 2012

À Godot

Fomos feitos da espera. E a espera é nossa meta, porque é nossa origem. Nossos pais, um dia, nos esperaram. No ventre originário de todos os universos, enquanto nos esperavam, esperavamos a hora de nascer, ato ao qual responderíamos com o choro.
Talvez por isso fique para sempre o medo da espera. Sabemos que no fim da espera podemos chorar, Na língua portuguesa criamos a saudade, que é um embuste para espera. Gloriosa invenção! Em geral, quando nos encontraos no limite da espera ansiosa, lembramos todas aquelas coisas que no acariciam a memória como seda, fria e leve, uma brisa que nos lembra que a espera também vale a pena, pois somente porque um dia esperamos fomos capazes de armazenar todas aquelas vidas que nos voltam pela saudade.
A espera só tem começo. Não tem fim. Se os fios da espera acabam, devemos, tal qual Penélope, desfazer o emaranhado bordade com a face dos nossos amores. Somente para recomeçar outra vez. Pois a espera é ela mesma, a meta.
Só aos desesperados cabe a esperança. Por isso espera e esperança são coisas diferentes. A esperança foi a última a sair da caixa maligna de Pandora. Mas quem a abriu foi a espera. Por não saberem esperar, Adão e Eva provaram do fruto proibido.
Esperar não leva à inação. Esperar é um propulsor. É a espera que me leva além. Pois quem espera é impaciente. E quem é impaciente se precipita. Quem espera é confiante, não esperançoso. E mesmo que o seja, e desesperado. É de um desespero diferente, é um desespero metodológico. É-se desesperado não porque já não se tem fé, mas porque é o único meio de comprová-la. É o desespero cínico, que se engana somente para se mostrar capaz.
A espera é alheia ao tempo, mas subordinada à intensidade: os dias podem passar como segundos, mas serão os segundos mais dolorosos. Por isso, esse que espera desesperado, faz jus à sabedoria dos antigos segundo à qual ninguém pode ser digno de felicidade, pois essa só existe como hybris. Este, no entanto, não sabe que é feliz. Pois a felicidade nos cabe somente no ponto em que não nos estava destinada. A Justiça é sem nome, e é nesse não-saber da felicidade, vinda da espera, que fazemos jus à magia da Liberdade. "Unicamente conhece um ser humano, aquele que o ama sem esperança"
A espera é a meta, porque é como os ajudantes dos livros de histórias infantis, ou como os bizarros personagens de Kafka, ou como os seres cuja natureza se desconhece nos mundos de Tolkien: são os seres esquecidos no fim da história. Mas continuam em nós, mesmo como esquecidos.
A espera alimenta-se do caráter destrutivo que vive não do sentimento de que a vida vale a pena ser vivida, mas de que o suicídio não vale a pena. A espera é a meta porque ela mesma é uma armadilha. É algo a ser vencido, somente para que esperemos outra vez. Porque toda espera é um ensaio para a espera final.