sábado, 31 de outubro de 2009

Aqualung






O disco "Aqualung" da banda britânica Jethro Tull é provavelmente um dos discos mais ricos do rock dos anos 70. Nele, Ian Anderson, flautista, vocalista, violonista e líder da banda, tece com a peculiar wit britânica uma crítica ferrenha à sociedade da época. Anderson não é um músico engajado em causas políticas, embora tenha lá sua fundação de apoio à vida selvagem felina. Somos levados a crer que uma ação política de sua parte - voltada aos homens, lógico e não aos pobres gatinhos - seria de grande significância, mas tenho razões para acreditar no contrário. Seu engajamento, assim como o de muitos outros artistas, provavelmente continuaria no âmbito insitucional, jurídico, legal, que, quando dá com uma mão comida aos famintos de Darfur, com a outra dá apoio aos rifles israelenses para o assassinato de criancinhas palestinas em nome da Democracia.




É melhor que a crítica tenha sido num disco e, embora a crítica à Industria Cultural possa ser feita, ou seja, de que a mercantilização deste disco e a produção em massa já oferece o capital necessário para a reprodução das ONGs e instituições das quais os artistas engajados fazem parte, uma saída é sempre possível. A forma como a interiorização dos conteúdos transmitidos se dará não pode ser totalmente calculada.


O fato é que a crítica (um tanto quanto nietzscheana) de Anderson à Igreja Anglicana, na segunda parte do álbum, continua atual e pode ser transposta a outros âmbitos, na medida em que completa a primeira metade do disco, que realça o olhar sobre o mendigo Aqualung, a prostituta vesga Mary, a cafetina Mother Goose e os transeuntes de uma Picadilly Circus lotada.


O fato de sua crítica ser introjetada e personalista é exatamente o que dá força às canções do álbum, com acentos poderosos de piano e uma mão rápida no violão, que mostram que, se até certo ponto, não há ação de curto prazo possível, há como conhecer a realidade que se efetiva escancaradamente.


Seguindo uma longa tradição britânica - a flauta de Anderson nos remete a madrigais elizabetanos da melhor estirpe - o Jethro Tull delicadamente retoma Shakespeare ao mostrar que a "Sabedoria clama pelas ruas, mas ninguém lhe dá ouvidos".





PS: Atentem também para as ilustrações do álbum e o "Gênese" contido no encarte.

Um comentário:

  1. Querido, venho dizer que tenho lido seu blog sempre, e gostado demais. Descobri ao acaso, num dia em que você estava online no msn, e corri para cá. Surpresa (ou nem tanta): maturidade verbal sem hipocrisia velha. Se quiser, pass pelo meu também. Comecei ontem, mas com textos que já estavam esperando oportunidade. E continuarei(emos) nos lendo e escrevendo. Abraços e saudades. Thiago Majolo (http://terrasbaixas.blogspot.com)

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