sábado, 6 de fevereiro de 2010

O Funâmbulo

Há uma anedota de Thomas Bernhard que resume bem a forma a qual as relações interpessoais se dão atualmente. O conto diz o seguinte:
"Um cômico que havia anos ganhava a vida sendo apenas e tão somente cômico e lotava todas as salas em que se apresentava, tornou-se de repente a tão aguardada sensação para um grupo de bávaros em excursão que o descobriu no topo do penhasco sobre o chamado Pferdeschwemme, o bebedouro dos cavalos de Salzburgo. O cômico afirmou perante o grupo de excursionistas que, do jeito que estava, de calça de couro e chapéu tirolês, iria se jogar de cabeça lá de cima, ao que, então, como de hábito em se tratando dele, o grupo rompeu numa gargalhada. O cômico, no entanto, teria dito que falava sério e, de fato, se atirado do penhasco no mesmo instante" (BERNHARD, Thomas. O Imitador de Vozes. São Paulo: Companhia das Letras, 2009).
Quem já não se sentiu como esse cômico, esse funâmbulo nietzscheano a quem nada mais resta senão sua própria arte?
A questão é que a vida em si é uma arte. É um poema. e ser poeta é, de fato, difícil demais. As pessoas que fazem de sua vida uma coisa qualquer - e, vejam bem, "coisa qualquer é algo impensável ao artista, é algo amorfo, matéria-prima bruta - são, no fundo, corações normalizados, são lugares comuns, são pessoas que abriram mão da vida antes mesmo de conhecê-la ou começá-la.
Só prova que o individualismo corrente dos dias (nem tanto) atuais, é uma piada. Só há um "eu" quando sou chamado de "você".

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